quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

AF148

Confusão pouca é bobagem , e tudo pode piorar dentro de um avião com 400 pessoas e um vôo overbooked. Sem assento marcado, sentamos separados.

Do meu lado esquerdo, uma indiana simpática que estava estudando na Europa (ou pelo menos foi o que eu consegui entender do impossível inglês que eles falam). Do outro, um mini indianinho aflito.

Minutos mais tarde, a comissária de bordo vem explicar, por mais bizarro que isso possa parecer, que o cartão de embarque dele foi trocado com o de outra pessoa na hora de embarcar, muita gente, desculpe a confusão, e que ele precisaria trocar de lugar com o amigo que havia ficado com o cartão dele.

Atrás dela, aparece a figura que todos imaginamos ver na Índia, turbante amarradinho daquele jeito incrível, barba grisalha até o meio do peito, meio sorrindo, meio formal, meio engraçado, meio guru. Pacotinho na mão, deu uma arrumada na bagunça que tava o compartimento das bagagens (eu e minha amiga indiana jogamos tudo de qualquer jeito lá), colocou o pacotinho canto e sentou do meu lado.

Do meu lado seria um eufemismo, porque ele sentou praticamente no meu colo, já falou oi pra indiana, perguntou onde ela morava e de onde estava vindo. Num inglês que, depois de conhecer outros indianos descobri que era fantástico, perguntou de onde eu estava vindo (Paris), onde eu morava (Brasil), se meu país era muito longe (11h de avião até a França), se era muito pobre (em alguns lugares, sim, mas também tem muita riqueza), se era muito grande (não tão grande quanto a Índia, mas tem 200 milhões de habitantes), se era muito quente (no norte, o tempo todo, mas em outros lugares, verão quente e inverno frio), se tinha montanhas, planícies (tem um pouco de tudo, muito litoral, floresta – inclusive a amazônica – montanhas, planaltos), se eu morava no sul ou no norte (no meio, mais para o sul), se eu tinha alguma descendência indiana, pois me parecia muito com indianos (não, não tenho não), mas se parece (é, acho que sim), se todos os brasileiros tinham traços assim indianos (olha, vendo por esse ângulo, acho que sim, um pouco) se eu ainda estava estudando (não, já sou formada), em quê (arquiteta), se eu trabalhava por conta ou numa empresa (numa empresa, grande), construtora (é sim, construtora), se eu estava indo encontrar amigos na Índia (não, estou indo com meu namorado, que está em algum lugar nesse avião, só para conhecer), se o meu namorado era arquiteto também (sim, arquiteto – nessas horas é mais prático dar uma mentidinha). Enquanto eu tomava fôlego, e depois dizer que eu ia ver muitas obras interessantes de arquitetura na Índia, perguntou se eu não queria que ele trocasse de lugar com meu namorado, pra que a gente viajasse junto. Pegou o pacotinho, atravessou o avião, trocou de lugar, sorriu para o novo vizinho, um americanão mal-encarado que possivelmente não daria a menor trela pro nosso amigo hindu. Oito horas depois, pousamos em Delhi.

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